domingo, 20 de fevereiro de 2011

Arrependimento

Dizemos todos nós em períodos de arrependimento a tão repetida e famosa frase: "ai, se eu soubesse na altura o que sei hoje." E a seguir a isto enchemo-nos de sentimentos depreciativos sobre os erros que fizemos e que juramos não voltar a repetir (e que, invariavelmente, até voltamos). Isto porque presumimos no nosso melhor "Regresso ao Futuro" que de alguma forma misteriosa poderíamos ter evitado um erro com um conhecimento que só alcançámos depois do erro já ter sido cometido, simplesmente entrando no nosso belo Delorean* imaginário e apagando o respectivo evento. E isso é fundamentalmente um resumo do que é o arrependimento não é verdade? Gastamos nós uma quantidade indeterminada de horas de vida a ponderar sobre coisas que devíamos (ou não) ter feito, em vez de estarmos realmente a aproveitar e fazê-las. Pior, temos o desplante de dizer que a "Ignorância é um estado de graça", presumindo que não saber algo nos traz a felicidade onde o conhecimento só traria sofrimento. É preferível não sabermos que a nossa cara metade tem um amante ou que o nosso melhor amigo fala mal de nós pelas costas? De facto é um conhecimento que traz sofrimento... mas também elimina algumas das (muitas) ilusões nas quais tecemos o nosso dia-a-dia.

Conhecer tem o extraordinário poder de mudar a nossa percepção sobre as coisas. Talvez não sejam tão bonitas como eram quando éramos ignorantes, mas são profundamente mais verdadeiras. O arrependimento, em todas as suas formas, torna-se pois uma forma de tentar em vão ignorar a realidade e voltar à ignorância. E queremos tanto manter-nos ignorantes que conseguimos passar a vida toda a enganar-nos a nós próprios sobre uma determinada situação, se for preciso até morrermos por isso (como é o caso das drogas por exemplo).

Lamento, pessoalmente prefiro sempre saber e não ficar ignorante. Claro que à medida que vamos destruindo as ilusões que nos rodeiam (diga-se, levantado a maya, o véu que cobre a nossa percepção e nos impede de ver a verdadeira realidade) apercebemo-nos que o mundo é um lugar bastante mais triste do que pensamos, mas também muito mais real. O conhecimento só é alcançado através do sofrimento. Ou melhor, é o sofrimento que nos leva à procura do conhecimento. Porque haveríamos nós de quebrar a nossa homeoestase se tudo fosse agradável e maravilhoso?

Porque é que nos arrependemos então? Se dermos uso ao nosso bom senso e tomarmos decisões baseadas na informação que temos na altura, parece-me parvo nos arrependermos quando por vezes as coisas não correm bem. São os erros e as falhas que nos permitem crescer. Não seria muito mais aborrecido se corresse sempre tudo bem?



* Para os leitores posteriores à geração de 80 ou que por alguma (estranha) razão não gostam de ver filmes, Delorean era a marca do carro do filme "Regresso ao Futuro", que permitia - alcançando as então complicadas 90 milhas por hora - viajar no tempo.